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  • Foto do escritorColetivo Clóvis Moura

Por que Clóvis Moura?

A publicação inaugural no Blog do Coletivo Clóvis Moura é dedicado a breve recuperação da vida e obra daquele que dá nome ao Coletivo, o sociólogo e historiador Clóvis Moura. Nós o escolhemos como patrono do Coletivo não somente porque o conjunto de sua obra e pensamento solidifica amplamente ao nosso entendimento acerca da formação econômica no Brasil, mas porque interpretações como as de Clóvis Moura são sistematicamente silenciadas e excluídas do debate acadêmico nas Humanidades. Portanto, quem melhor que um intelectual negro, que propôs um novo olhar sobre a formação do Brasil e que foi combatido, não com argumentos, nem contrapontos, mas com ostracismo, para dar nome às nossas atividades?

Clóvis Moura nasceu no Piauí, na cidade de Amarantes, em 1925. Sociólogo pela Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, suas atividades na academia estiveram muito ligadas ao jornalismo, não se restringindo, com incursões nos campos de história e literatura. Ademais, Clóvis Moura foi militante do PCB, sendo suas discussões raciais o motivo para o rompimento com o partidão. Após seu rompimento, Clóvis Moura nunca mais integrou um partido, apesar de ter mantido contato próximo com a corrente que fundou, em 1962, o PC do B.

Dentre suas principais obras estão:

  • Rebeliões da senzala: quilombos, insurreições, guerrilhas (1959)

  • Argila da Memória (1962)

  • O Negro: de Bom Escravo a Mau Cidadão? (1977)

  • A sociologia posta em questão (1978)

  • Diário da Guerrilha do Araguaia (1979)

  • Os Quilombos e a Rebelião Negra (1981)

  • Brasil: as raízes do protesto negro (1981)

  • Sociologia do Negro Brasileiro (1988)

  • As injustiças de Clio: o negro na historiografia brasileira (1990)

  • Dialética Radical do Brasil Negro (1994)

  • Dicionário da escravidão negra no Brasil (2004)

Sua obra inaugural, Rebeliões da senzala: quilombos, insurreições, guerrilhas (1959), com cinco edições, foi publicada originalmente pela editora Zumbi, como resultado de uma pesquisa iniciada em 1948. O livro traz um contraponto ao atual estado das interpretações de formação do Brasil da década de 1930 e 1940, expressado pelas obras - metodologicamente diversas entre si, mas coesas quanto à interpretação racial - de Gilberto Freyre, Caio Prado Jr e Sérgio Buarque de Holanda. O escravizado toma o centro do processo de formação do Brasil, compondo as lutas nacionais e como sujeito ativo na dissolução do modo de produção colonial-escravagista. Questiona-se a ideia vigente - e presente até hoje nos cânones das Interpretações do Brasil - do negro como mera peça de trabalho, como elemento degenerado pela sua raça ou, mesmo, como elemento passivo na formação social. Cai por terra a ideia de equilíbrio entre senhores e escravizados.

Este livro é tanto o marco inicial de uma obra prolífica, bem como, a síntese de um pensamento coeso e preciso sobre a formação social do Brasil. Suas obras posteriores, e as edições de Rebeliões da senzala, conformaram uma interpretação bem sucedida em incluir, junto ao sistema de classes, os processos históricos e sociais específicos ao Brasil. Para além, dá pistas à investigação dialética do capitalismo como um modo social de produção estruturado pelo racismo e pelo sexismo.

Este contexto nos ajudou a construir as reflexões e a dar respostas às questões que nos surgiam sem descanso. Nossa experiência enquanto acadêmicos, intelectuais em formação, escritores, pesquisadores e cientistas sociais - sempre qualificados pelo adjetivo racializado “negros” - contrastava uma miríade de situações que não eram pertinentes aos nossos pares brancos. A bibliografia e interpretação que nos foi colocada, durante toda essa trajetória de formação, não era capaz de responder anseios e questões que nos eram - e ainda são - impostas no dia a dia. As páginas que líamos, frequente e simbolicamente, eram mais brancas do que podíamos imaginar. Uma interlocução que só nos saltou aos olhos quando percebemos a marca em comum da maioria desses autores: uma noção de hierarquia civilizatória e racial, uma tutela - velada ou explícita - da branquitude.

É por isso que, como Clóvis Moura, direcionamos nossos esforços em questionar tais interpretações. Denunciamos leituras insuficientes, ensimesmadas, imprecisas e racistas. Buscamos uma interlocução negra, apoiada em extensa pesquisa, rigor metodológico e práxis. Acreditamos na transformação ativa e revolucionária da sociedade e no fim do racismo, encontrando parte do nosso papel na contestação e derrocada do establishment da branquitude na compreensão do mundo.

Referencial bibliográfico


SILVA, Mário A. M. da. Rebeliões da senzala: quilombos, insurreições, guerrilhas CLÓVIS STEIGER DE ASSIS MOURA São Paulo: Anita Garibaldi, 2014, 452p (resenha). Rev. Crítica Marxista Nº 43, 2016.

FARIAS, Marcio. Clóvis Moura e o Brasil: um ensaio crítico. São Paulo: Editora Dandara, 2019.

SILVA, Wanessa H. da. A trajetória intelectual de Clóvis Moura (1925-2003): a interdisciplinaridade e o protesto negro. 30º Simpósio Nacional de História - ANPUH. Recife, 2019.



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